Contribuição Assistencial: valorização das negociações coletivas e fortalecimento dos sindicatos

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O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria a favor da constitucionalidade do desconto da contribuição assistencial, prevista em acordo ou convenção coletiva, de todos os trabalhadores e trabalhadoras beneficiados, sejam sócios ou não do sindicato, mas com direito de oposição.

A decisão da Corte, que mudou a sua posição pela inconstitucionalidade, adotada em 24 de fevereiro de 2017, recoloca de forma qualificada o tema em discussão e favorece a posição que as Centrais Sindicais vêm negociando com o governo e a classe patronal no âmbito do grupo tripartite sobre “valorização das negociações coletivas e fortalecimento dos sindicatos”.

A manifestação contrária por parte da classe patronal e de alguns liberais evidenciam as posições antissindicais que têm predominado no Brasil, destacadamente desde a reforma trabalhista de 2017.

Até então, o movimento sindical conseguiu resistir aos ataques antissindicais e assegurar o desconto assistencial ou taxa negocial por meio de acordo ou convenção coletiva, devidamente aprovados em assembleias gerais abertas à participação de sócios e não sócios.

Na verdade, há 77 anos, está em vigor o art. 513, alínea “e” da CLT, que assegura aos sindicatos:

Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos: (Redação restabelecida pelo Decreto-lei nº 8.987-A, de 1946)………………………………………..

e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas. (Redação restabelecida pelo Decreto-lei nº 8.987-A, de 1946)

Desde então, inclusive no período do regime militar, tornou-se rotina aprovar em assembleia, negociar a inclusão em Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) ou Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), aprovados em assembleia com a participação de sócios e não sócios, e as empresas procederem o desconto de todos trabalhadores e trabalhadoras.

Com o florescimento das ideias neoliberais no início da década de 1990, as empresas passaram a estimular e organizar seus trabalhadores para que pressionassem suas entidades a devolver o valor descontado. Ou, então, a não descontarem e a encaminharem lista de assinaturas de oposição dos trabalhadores. Esta pressão organizada ora crescia, ora arrefecia.

Com o reconhecimento das Centrais Sindicais, em 2008, e a destinação de 10% do arrecadado às Centrais às quais eram filiados os sindicatos, o assunto voltou a ganhar relevância nos embates sindicais e políticos. Decolou de vez, com a ofensiva para desregulamentar os direitos trabalhistas, previdenciários e sindicais, que culminaram na aprovação das reformas trabalhista e previdenciária e na aprovação da terceirização irrestrita depois do golpe que interrompeu o mandato de Dilma Rousseff em 2016.

Foi neste contexto, que em 24 de fevereiro de 2017, o STF aprovou a tese de repercussão geral: “É inconstitucional a instituição, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuições que se imponham compulsoriamente a empregados da categoria não sindicalizados”.

No final daquele ano a Lei n° 13.467, de 13 de julho de 2017 (reforma trabalhista) entrou em vigor, tendo tornado optativo o desconto da contribuição sindical (antigo imposto sindical) em favor dos sindicatos. Determinando assim, de forma reiterada, que o desconto estava condicionado à autorização prévia.

Art. 545. Os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato, quando por este notificados.

Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação.” (NR)

Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos.

A contribuição sindical, chamado de imposto sindical, contra o qual a CUT lutava desde sua fundação; em torno do qual o movimento sindical se dividiu no processo constituinte; novamente nas duas tentativas de reforma sindical, em 1994 e 2004/5, deixava de ser um imposto de fato e se tornava uma contribuição sindical optativa.

Estudo do IPEA revela que entre 2017 e 2021 a arrecadação dos sindicatos de trabalhadores com esta contribuição sindical despencou de R$ 1,47 bilhão para apenas R$ 13,11 milhões (valores nominais). Além de drástica, essa redução foi abrupta, sem o devido tempo de adaptação para os sindicatos de trabalhadores.

Tudo isto ocorreu em um cenário de queda nos percentuais de sindicalização em todo o mundo, em face das transformações no ambiente do trabalho, destacadamente a redução e flexibilização de direitos, a terceirização, a precarização e a pulverização do trabalho. É neste contexto que a contribuição assistencial se tornou a única fonte de receita, além das reduzidas mensalidades.

Finalmente, o STF está prestes a fazer justiça ao rever sua posição pela inconstitucionalidade da instituição de contribuições obrigatórias a empregados e empregadas não sindicalizados.

A decisão do STF é clara sobre a sua constitucionalidade:

 É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição (STF, Pleno, sessão virtual de 14/4/2023 a 24/4/2023)

No contexto da reforma trabalhista, muitos dos chamados “retrocessos” não vingaram totalmente, como o trabalho intermitente. Mas ainda são muitos os retrocessos que precisam ser revistos. E a declaração pelo STF de que a contribuição assistencial é constitucional ajuda, mas não resolve inteiramente o problema do custeio das atividades sindicais.

É preciso estabelecer claramente esta situação em lei, o que deverá ser um dos resultados das negociações em andamento no grupo tripartite que está discutindo a valorização das negociações e o fortalecimento dos sindicatos. A classe patronal sabe, que suas Federações sobrevivem de parte dos recursos do “Sistema S”, aos quais o movimento sindical dos trabalhadores não tem acesso.

O setor patronal está ciente da queda no percentual de sindicalização derivado dos processos de precarização e terceirização em andamento, do aumento da rotatividade, da incerteza e insegurança no trabalho.

E as direções sindicais estão cientes de que suas entidades precisam se transformar profundamente, alinhando-as às exigências de um mundo do trabalho fragmentado e pulverizado, formas de contratação precarizadas e multivariadas, onde a remuneração através de salários tem sofrido sistemáticos ataques em nome do empreendedorismo. Enganam-se aqueles que consideram que a decisão do STF assegura a totalidade dos recursos necessários para as lutas sindicais.

A decisão da Suprema Corte é importantíssima, mas uma campanha de sindicalização ampla e massiva, nos locais de trabalho e nos territórios, deve carregar em sua narrativa a soberania das assembleias, à qual estão submetidos todos e todas que são favorecidos pelos acordos e convenções por elas aprovadas.

São as assembleias sindicais os órgãos soberanos das categorias profissionais e econômicas num Estado Democrático de Direito. Não são os sindicatos que impõem as contribuições e outras decisões, mas, as categorias, nas respectivas assembleias. Numa assembleia sindical pode ser aprovada ou reprovada uma contribuição assistencial proposta pela direção do sindicato e, isso, faz parte do que realmente se chama liberdade sindical, quando exercida de forma plena nos seus devidos termos.

* Luiz Antônio Alves de Azevedo é mestre em Sociologia Política. Foi dirigente sindical e deputado estadual. Sócio da Veredas Inteligência Estratégica. Autor do livro Sindicalismo sob ataque e Reforma Sindical.

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