Para onde caminhamos? 

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A chave para conquistar a modernização é o desenvolvimento da ciência e tecnologia. E, a menos que prestemos especial atenção na educação, será impossível desenvolver a ciência e a tecnologia. Palavras vazias não vão levar nosso programa de modernização a lugar algum; devemos ter conhecimento e pessoal treinado. […] (Deng Xiao Ping)

As palavras acima, ditas pelo líder chinês no fim dos anos 1970, indicaram a direção e os instrumentos da profunda transformação da sociedade e da economia daquele país. Trinta anos depois, aquela economia rudimentar deu lugar a uma nação moderna, com uma ascensão social impressionante, embora persistam enormes desafios para que o desenvolvimento alcance efetivamente toda a população, superior a 1,4 bilhão de habitantes. 

Foto: Freepik (https://br.freepik.com/fotos-gratis/cena-em-preto-e-branco-da-grande-muralha-da-china_187445204.htm)

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A transformação chinesa é possivelmente o maior acontecimento econômico-social contemporâneo, mas não o único. Podemos lembrar também o caso da Coreia do Sul e mais recentemente o do Vietnã, embora em menor proporção. Cada um tem suas especificidades, mas todos possuem em comum uma remodelação efetiva das suas estruturas econômicas, com implicações nos tecidos sociais, deixando para trás sistemas agrários arcaicos. Vejam o que era a Coreia do Sul nos anos 1970 e em que se transformou, em termos de desenvolvimento tecnológico, empreendedorismo econômico e mesmo em difusão de renda. 

Esta referência inicial, olhando para alguns casos exitosos de desenvolvimento, é aqui trazida para descortinar a questão sobre o Brasil. Não se trata de sugerir cópias de receitas prontas, mas de demonstrar a necessidade imperativa de perguntar para nós mesmos para onde caminhamos. O que queremos construir? Qual País nossas lideranças políticas, jurídicas e econômicas estão moldando? 

Para pensar nosso futuro, precisamos romper amarras e sair do debate cotidiano enredado na miscelânea de movimentos e contramovimentos conjunturais dos mercados, atrelados a um cipoal de disputas paroquiais e corporativas nas arenas políticas. 

Continuaremos presos aos insossos debates sobre ajustes orçamentários, submetidos a premissas falsamente “científicas”, sem estarem sujeitas a questionamentos? 

Continuaremos negociando pedaços dos parcos recursos públicos para atender interesses de lideranças regionais, sem dimensionar seus aspectos técnicos e de viabilidade econômica e social? 

Continuaremos a conviver com uma infraestrutura deplorável que evolui a passos de cágado e não permite modernizar nossas estruturas de produção e distribuição? 

Continuaremos a fazer eternos discursos sobre nossa vergonhosa desigualdade de renda e patrimonial? Um discurso que ressoa a ouvidos moucos como um lamento tosco ao qual não associam os assustadores índices de violência urbana que se normaliza em nosso cotidiano. 

As distorções sociais que marcam nossa história não aceitam mais diagnósticos e belos discursos. Esta realidade incômoda que já carregávamos agora se soma a tragédias climáticas que se intensificam e tem o seu ápice na destruição sem precedentes no Rio Grande do Sul. 

A conta das transformações dos tempos com o aquecimento global chegou e é pesada. Suas consequências já não são ameaças, mas realidade. 

O novo tempo exige uma profunda revisão de prioridades das políticas públicas nos três níveis da federação. Também pressiona para que as lideranças políticas e econômicas se reposicionem nas disputas ideológicas. E será inexorável construir espaços para debater com profundidade ainda não vista as premissas econômicas e orçamentárias que têm garroteado a atuação governamental, com diagnósticos aparentemente assépticos, mas falsos e de consequências malévolas. Referimo-nos ao mito do orçamento equilibrado como um totem em torno do qual todos precisam se curvar. 

Vivemos uma especial oportunidade para dar partida à construção de um projeto nacional que finque as bases de um desenvolvimento inclusivo. Todavia, sair da retórica exige atitude que priorize um verdadeiro planejamento social e econômico. Faz tempo, nosso País não se encontra para avançar na direção de metas e propósitos definidos em um planejamento indicativo dos processos e caminhos a serem seguidos. A polarização política aprofundou o desgaste na construção de propostas técnicas abertas ao debate. Falar em planejamento passou a ser coisa de grupos ideológicos que não têm domínio da boa economia. Esta é a visão estreita predominante, apoiada por grande parte da mídia corporativa em editoriais e por articulistas que se confundem com bonecos de ventríloquos. Insistem em comparar orçamento de uma nação com orçamentos domésticos, sem qualquer pudor. 

Aqui voltamos ao ponto inicial que mira o desenvolvimento da pesquisa e da tecnologia em países que cresceram com transformações de suas estruturas sociais e econômicas. Não há outro caminho a não ser o do desenho de uma cruzada nacional em favor do fortalecimento de projetos de futuro com focos maiores na educação, na tecnologia e na inovação, mas todas as ações linkadas na efetiva difusão dos seus benefícios para a sociedade nacional. 

O Brasil precisa ampliar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, se quiser mudar de patamar no cenário internacional. Estamos muito atrás dos países da OCDE e mesmo de nações em desenvolvimento. Neste século, temos nos limitado a alocar valores próximos a 1% do PIB, chegando a 1,37% em 2015. A Coreia evoluiu nas duas últimas décadas de 2,13% para 4,8% em 2020. A China, ao decidir pela nova etapa do planejamento econômico, passou de 0,89% para 2,4% do PIB. Os EUA superaram os 3,45% em 2020. Alemanha e Japão estão acima de 3% e Israel superou os 5% em 2019. Os países que planejam o futuro dão total primazia aos seus centros de ciência e tecnologia. É claro que, além de gastar mais, é preciso ter estratégia bem calculada para gastar bem. 

Passa da hora de se ter um debate nacional sobre o nosso futuro. O que seremos daqui a três ou quatro décadas exige um repensar de premissas e prioridades de todos os agentes públicos e privados, deslocando-se de posições bolorentas que não podem mais ser aceitas. O momento é agora. A solidariedade nacional que se manifesta por todos os cantos revelada no apoio ao povo gaúcho precisa ser adubada e ganhar raízes na organização de um ambiente proativo que projete um Brasil maior, melhor, mais justo, superando os extremos agressivos e repugnantes que tiveram sustentação fácil por vários anos. 

*Por Guilherme Lacerda, doutor em Economia pela Unicamp. Foi presidente da Funcef e diretor do BNDES. É associado da Veredas Inteligência Estratégica.

*Por Ricardo Berzoini, foi ministro da Previdência, das Comunicações e de Relações Institucionais. Ex-deputado federal, é aposentado do Banco do Brasil e sócio da Veredas Inteligência Estratégica.

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